sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Entrevista com Charles Gavin em 2003


Entrevista Exclusiva - Charles Gavin

Claudio Szynkier - 06/11/2003


Após coletiva dedicada ao lançamento do novo álbum (Como Estão Vocês?), ainda em plena correria, o baterista dos Titãs, Charles Gavin, concedeu entrevista exclusiva e generosa - apesar de rápida - à Agência Carta Maior.

Carta Maior - A História dos Titãs é marcada por uma grande estabilidade dentro do cenário do rock nacional. Vocês transmitem o som da banda em uma escala de tempo que já compreende gerações. Vocês, em termos sonoros, formam gerações?

Charles Gavin - Olha, tem acontecido algo engraçado nos shows. A gente já chegou a ver avô com neto (risos). O que mais vemos é pai com filho, mãe com filho, pai com filha, mãe com filha, mas eu acho que é um processo natural. A gente influencia as novas gerações, que, por sua vez, nos influenciam, e a gente devolve a informação.

É um processo até dialético: não tem como nos mantermos fechados. O que nós fazemos não é para isso, não é "sobre" isso. E, automaticamente, nós ainda somos uma banda que tem assunto, uma banda relevante para o cenário brasileiro. O que acontece é isto: uma troca. Influenciamos muita gente que nos influenciou de volta. E a gente está aqui, como você disse, após passagem de gerações, 21 anos depois.

CM - Um dos primeiros discos que eu ganhei, ainda na infância, em um Natal, foi o Cabeça Dinossauro.

CG - É, eu imagino (risos). É bastante curioso pensar que tem gente que vai ao show, hoje, e que estava nascendo, ou tinha 4, 5 anos, quando este disco foi lançado. A gente se relaciona bem com isso, são 21 anos! A gente espera este tipo de coisa!

CM - Vocês têm um compromisso com a atualidade. Com o "parecer atual". Talvez isso determine o fato de vocês estarem mandando o recado há tanto tempo, e até agora. Como ocorre isso?

CG - Eu não acho que seja exclusividade nossa. Nós nos mantermos informados, antenados e atualizados, é uma questão de troca de informações. Nós compramos muitas coisas novas; ficamos atentos às coisas boas que saem, às bandas que acontecem, que são lançadas, ao tipo de música que vai aparecendo em cada cenário. Eu, por exemplo, sou um cara que gosta de qualquer coisa. Eu ouço de tudo, de tudo o que você pode imaginar. Eu não tenho nenhuma restrição a qualquer estilo, cada vez mais. E olha que, no passado, eu já tive.

Eu gosto tanto do disco do Marcelo D2, quanto do Gotham Project, que é um projeto de música eletrônica. Acho o White Stripes uma banda razoável. Eu não acho tudo isso que falam. Vi o show recentemente e gostei mais do disco do que da própria apresentação. Gosto muito da Beth Gibbons. Adoro o disco dela e gostava muito da banda que ela tinha, o Portishead. Ao mesmo, eu nunca deixei de ouvir Sepultura! Sempre fui fã dos caras, desde o primeiro disco até o mais recente. Nós, então, vivemos nesse tipo de "salada". Acho que é esta a questão por trás desse "estar antenado".

CM - Por falar em Sepultura, você gravaram, com a produção do americano Jack Endino, em 93, um disco mais pesado, o Titanomaquia. Aquele tipo de referência ainda habita as idéias da banda?

CG - Habita, sem dúvida. Temos alguns momentos no álbum novo que têm um pouco a ver com aquilo. Veja, por exemplo, a faixa Vou Duvidar, música do Paulo e do Sérgio. Tem um componente "Titanomaquia" nesta faixa. São características que a gente nunca vai perder. Simplesmente acontece, sendo o processo de realização de um disco algo totalmente imprevisível - as coisas vão ocorrendo naturalmente -, de investirmos muito em uma determinada característica e não exatamente em outra. Isto ocorre em alguns momentos.

Em outros discos, por exemplo, equilibramos mais uma coisa ou outra. Eu acho que essas características nunca vamos perder. De Titanomaquia à música Sonífera Ilha. Isso fez parte da formação da banda, entende? São informações intrinsecamente contidas quando compomos. O que acontece, muitas vezes também, no estúdio principalmente, é ver uma canção adquirir vida tão própria, depois que a fizemos, que esta passa a pedir um tipo de solução musical que escapa do nosso controle!

CM - O que a banda perde exatamente com a saída do Nando Reis? Ele é um cara que compõe bastante, e com bastante lirismo. Vai embora com ele aspectos importantes do "RG" musical da banda?

CG - A gente, simplesmente, perde as músicas que o Nando compõe. Porque as músicas que ele compunha e cantava dentro do grupo faziam parte do nosso show e do nosso repertório. E, agora, ele vai cantar as músicas dele sozinho, com essas características que você notou. A gente passa a ter uma pessoa, que, sim, era importante, fora da banda. O que podemos fazer? Mas essa é uma questão que cabe mais a ele, já que foi uma escolha dele, não nossa. Assim como aconteceu com o Arnaldo.

Mas, enfim, nós temos músicas com o Arnaldo até hoje. Há certas coisas que o Arnaldo faz que poderiam, tranqüilamente, fazer parte do repertório dos Titãs. Só que ele queria cuidar da vida dele. Queria mais privacidade, queria mais controle, por isso ele saiu. Acho que o caso do Nando é parecido. Ele queria ter mais controle sobre as coisas que vinha fazendo, trabalhando, compondo. Perdemos um cara importante, fundador da banda, mas, tudo bem, a vida continua. Vai continuar mesmo, com certeza. Aliás, temos uma capacidade de regeneração até assustadora. Basta observar-nos antes e depois da saída, da perda, de uma pessoa, é algo assustador. Nós nos regeneramos com muita facilidade. Recompomo-nos e recomeçamos a fazer a vida muito rapidamente.

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